Professores convidados debatem extremismo nos EUA
1 de novembro de 2017
“Sou nazista, sim!” (Charlottesville, 11 de agosto de 2017.) Pode parecer estranho ou anacrônico, mas essas foram as palavras proferidas por um manifestante supremacista em uma manifestação convocada pela extrema direita na cidade de Charlottesville, no Estado norte-americano da Virgínia. Essa marcha, que terminou em violência e morte, foi organizada em protesto contra os planos de remover a estátua do General Robert E. Lee, militar que comandou as forças dos Estados Confederados durante a Guerra Civil Americana, de 1861 a 1865.
Monumentos que representam ícones de heróis confederados devem ou não ser retirados do espaço público por supostamente cultuarem personagens que defenderam a escravidão?
Para debater com os alunos do Ensino Médio no evento Pausa pro Debate, a Escola Móbile convidou Alberto Luiz Schneider, professor do departamento de História da PUC-SP e especialista em temas ligados à memória e à sociedade, e também Carlos Gustavo Poggio, professor de Relações Internacionais, doutor em Estudos Internacionais e coordenador do curso de Relações Internacionais da mesma universidade.
Antes de abordar o tema da retirada dos monumentos, o professor Poggio explicou que, para entender o fortalecimento da extrema direita nos EUA e também na Europa, bem como o fenômeno da violência, cujo estopim foi a retirada da estátua do General Lee, é preciso considerar a nova ordem econômica como uma de suas causas.
Essa onda está associada, segundo ele, às “transformações ocorridas na estrutura econômica dos países desenvolvidos, que têm feito desaparecer os empregos que exigem menor grau de instrução e têm aprofundado a distância não apenas econômica, mas espacial e cultural, entre o topo e a base da pirâmide social”.
Segundo Poggio, a classe média norte-americana acredita que as altas taxas de imigração contribuíram para dificultar o acesso ao mercado de trabalho nos EUA, que apresentaria menos vagas disponíveis e uma maior concorrência entre os trabalhadores. Para o professor, essa combinação de fatores ajuda a compreender o recrudescimento do conservadorismo e a ascensão de Donald Trump, que durante a campanha prometeu trazer os empregos de volta.
De acordo com o professor Alberto Luiz Schneider, a existência de monumentos confederados nos EUA registra parte importante da história daquele país e, por isso, seria mais adequado “ressignificá-los”, em lugar de removê-los. Para ilustrar sua opinião, o professor de História citou o exemplo de uma cidade espanhola que, após a redemocratização, nos anos de 1970, ao invés de eliminar os monumentos franquistas – que faziam apologia à ditadura de Francisco Franco (1939-1975) –, manteve-os como forma de documentar os atos do franquismo.
Sobre o tema do encontro, o aluno do Ensino Médio Guilherme Ghefter destacou: “Creio que esse debate foi muito interessante, principalmente por ter feito com que eu refletisse sobre diferentes perspectivas.” Seu colega, Bernardo Albernaz, concorda com ele e reforça a percepção de que a conversa com os professores trouxe para o debate muitos aspectos interessantes que ele desconhecia sobre a sociedade norte-americana.
Para finalizar, outro aluno, João Pedro Barreto, relacionou o que estava sendo dito aos ataques ao Monumento às Bandeiras, no Ibirapuera, e, após pedir um aparte ao professor Schneider, apresentou sua tese: “Tomando esses monumentos como documentos históricos que contextualizam os bandeirantes, bem como as bandeiras e os seus objetivos, sua presença na cidade faz com que o genocídio dos índios também não seja esquecido.”
O envolvimento dos estudantes com o debate, mais uma vez, reitera nossa convicção de que é imprescindível oferecer espaços de discussão sobre os temas da atualidade, como foi esse Pausa pro Debate. Outras polêmicas virão, temos certeza.
Roberto Candelori é professor de Ética e Cidadania e coordenador do projeto Pausa pro Debate.