“Tempo, tempo, tempo”

23 de junho de 2017


No 1o ano do Ensino Médio, o projeto do Estudo do Meio trata do tempo, conceito amplo que permite explorar inúmeras facetas do conhecimento humano. Instalados em Itirapina (SP), os alunos visitaram diferentes espaços em municípios próximos e, a partir disso, elaboraram textos de variados gêneros – incluindo um diário de viagem, produzido pelos grupos de estudantes, para retratar bem o que aconteceu durante os três dias fora da capital.

No sensível diário a seguir, as alunas Bruna Abreu, Laura Delboni, Lívia Almeida e Mariana Neves descrevem suas percepções sobre o primeiro dia do Estudo do Meio e sobre a finitude dos seres e de tudo o que existe.

 

Diário de Viagem

 

Quarta-feira, 17 de maio de 2017.

 

O estudo do meio começou. Finalmente. Quarta-feira estava demorando muito para chegar, o tempo parecia não passar. Estava muito animada com a ideia de ficar os próximos três dias com os meus amigos.

A viagem foi longa. Saí de São Paulo pontualmente às 6h30 e cheguei ao Mirante do Gigante Adormecido por volta das 11h. O céu estava azul e não havia uma única nuvem. Por isso, pude ver perfeitamente a paisagem do local, que, com certeza, é uma das mais bonitas que já vi.

Sentei em uma das rochas e assisti a uma miniaula com o Kauê (professor de Geografia). Ele, junto com os monitores da UGGI, nos explicaram a formação rochosa do local. Contaram que há milhões de anos houve uma intensa atividade vulcânica na área. A lava expelida se alastrou e chegou a “cozinhar” e cobrir a rocha que formava o solo na região.

A partir dessas informações, analisei as rochas em que havia sentado e percebi a presença de características causadas por acontecimentos de milhões de anos atrás. Refleti sobre o tempo da natureza e notei como ele passa mais devagar do que o dos seres humanos, apresentando uma velocidade completamente distinta da dos homens. E como, por causa disso, ainda hoje é possível ver relações com rochas de milhões de anos atrás.

Além disso, os derrames basálticos criaram condições para a formação do maior aquífero do planeta, o Guarani. Pensei sobre o uso que nós estamos fazendo desse recurso. A velocidade de extração humana está diminuindo o nível da água, que não será reposta tão rapidamente pelo fato de o tempo geológico ter uma lógica distinta do ritmo humano de consumo. Essa diferença entre os tempos deve levar ao esgotamento da reserva de água.

Depois dessas reflexões, houve “dois minutos de silêncio”. Todos pararam de falar e ficaram parados ouvindo a natureza. Escutei sons que durante toda a aula não havia percebido porque a nossa fala os cobriu. Pássaros piando, galhos caindo e o vento agitando as folhas. Admirei a incrível paisagem e depois fui embora.

Encarei mais duas horas de ônibus para voltar para o hotel. Chegando lá, tomei banho e jantei. Após isso, fui para o observatório. Nele, ouvi uma palestra sobre as maravilhas do céu noturno. A instrutora falou sobre planetas, estrelas, órbitas, constelações, nebulosas e mais um monte de corpos celestes. Porém, o que realmente me marcou foi a ideia de finitude.

Estrelas transformam gás hidrogênio em hélio como forma de obtenção de energia. É o que as mantém vivas. Quando esse gás acabar, o corpo irá se desprender de seu núcleo e haverá uma explosão gigante, ou seja, a estrela irá morrer. As nebulosas, conjunto de gases que viram estrelas, também têm seu momento de acabar.

Todos nós acabamos. E quando digo nós, quero dizer tudo o que existe. A Terra será engolida pelo Sol, e esse também terá seu fim, assim como as outras estrelas. E cabe a nós aceitarmos isso. A finitude dos corpos ao nosso redor é natural, faz parte do ciclo que vivenciam.

Mas, por algum motivo, a nossa finitude não se encaixa nessa lógica. O fim do tempo de nossas vidas é encarado como algo triste e que deve ser evitado a todos os custos, inclusive congelando as pessoas. Se até as estrelas acabam, por que a gente não pode acabar? Por que o nosso final não pode ser tão natural quanto o esgotamento de gás hidrogênio?

Temos que encarar a morte de uma maneira diferente. Temos que perceber que ela faz, sim, parte do ciclo da nossa vida e é a única certeza que temos na vida. Temos que parar de temer a morte. Como Gilberto Gil poetizou uma vez, “Não tenho medo da morte, a morte é depois de mim”. Temos que aceitar que um dia nossa vida vai acabar e que isso não deve ser visto como uma dor e sim como o fechamento de um ciclo, de um tempo. Do nosso tempo.