Ver e rever a metrópole
31 de maio de 2017
Há uma estranha cidade em que uma biblioteca substituiu um presídio implodido (aquele dos 111 mortos). Nesse mesmo lugar, um antigo hotel de luxo (abandonado) do Centro transformou-se num edifício ocupado por moradores sem-teto. Há nessa cidade quilômetros de ciclovia, adorada e odiada por muitos. Há também galerias de grafite ao ar livre da zona leste à zona oeste. Há no local um impactante teatro realizado ao ar livre numa vila construída para operários no início do século XX e muros e muros e muros pichados, grafitados, coloridos, escurecidos. Todo esse cenário não pertence a um filme de Buñuel nem compõe uma tela surrealista de Dalí. Estamos falando de uma velha conhecida: a cidade de São Paulo.
Quando os padres jesuítas José de Anchieta e Manoel da Nóbrega subiram a Serra do Mar, nos idos de 1553, não imaginaram, ao se depararem com “ares frios e temperados como os de Espanha” e com “uma terra mui sadia, fresca e de boas águas”, que inaugurariam uma das cidades com maior vocação cosmopolita do mundo. Mais de quatro séculos depois dos primeiros exploradores oficiais, no mês de maio, os alunos do 2º ano do Ensino Médio se lançaram na aventura de redescobrir (e analisar) São Paulo, a cidade de 10.886.518 habitantes (19 milhões, se considerarmos a região metropolitana, ou seja, os 38 municípios que circundam a capital). Tendo como mote “realidade (?)” – tema discutido nas aulas de Filosofia (Prof. Felipe), História (Prof.ª Teresa), Geografia (Prof. Daniel), Língua e Produção de Texto (Prof. André) e Estudos Literários (Prof. João Cunha) –, vários grupos de alunos percorreram roteiros plurais da pauliceia desvairada (bem diferente daquela expressa poeticamente por Mário de Andrade na década de 1920) e registraram, por escrito, em vídeo e em fotografia, o resultado de suas investigações. Indignaram-se com a situação dos moradores de rua, sentiram a pulsação histérica do comércio, comoveram-se com as pessoas que não têm onde morar, ouviram cantadores de rua, recitaram poemas e tocaram num espaço cultural, experimentaram sabores, conviveram intensamente – em contextos diferentes dos habituais – com professores e monitores… Se o educador da Universidade de Barcelona Jorge Larrosa Bondía estiver certo e a verdadeira “experiência” for aquilo “que nos passa, que nos acontece, que nos toca”, e não simplesmente “o que se passa, o que acontece, ou o que toca”, nossos alunos, nessa maratona de três longos dias que começavam às 7h e terminavam quase à meia-noite, viveram uma experiência rara em tempos de distanciamento, frieza e falta de contato. Experimentar, nesse caso, significou romper estereótipos, exercitar a alteridade e rir e chorar diante da loucura que é viver numa cidade como a nossa.